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quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Veredas na paisagem árida

Se o sertão é dentro da gente, como desenhou Guimarães Rosa, ele também ajuda a repensar a formação da identidade brasileira. É o que defende o livro Sertão e Melancolia, da pesquisadora Karla Patrícia Holanda Martins que será lançado amanhã, às 17h30min, na Livraria Cultura. Resultado da tese de doutorado em Teoria Psicanalítica que defendeu na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em dezembro de 2001, a pesquisa de Sertão e Melancolia permaneceu na gaveta por mais de dez anos, até ganhar fôlego para publicação.

Ao transitar pelas teorias psicanalíticas que definem a melancolia, Karla Martins lança mão da literatura sobre o sertão e a história da constituição do País. “A leitura de Sertão e Melancolia desnaturaliza alguns dos mitos fundadores da nossa brasilidade, indicando de que modo as representações que temos do sertão derivam de diferentes versões de uma narrativa melancólica: o sebastianismo redentor; a idealização romântica da figura do sertanejo presente na obra de José de Alencar; a terra ignota de Euclides da Cunha; a ironia ferina de Graciliano Ramos, portador da denúncia da grande mentira nacional. Entre um estilo e outro, somos provocados a refletir acerca do que entendemos por e, sobretudo, do que desejamos como Brasil”, apresenta o psicanalista Daniel Kupermann, professor do Instituto de Psicologia da USP. “Karla nos adverte que inventar o Brasil implica reconhecer que habitamos um sertão. Sim, o deserto é fértil; a melancolia, Freud o demonstrou, também pode sê-lo”.

A melancolia sempre representou um enigma para a ciência, na elaboração da autora. “Freud foi igualmente mordido pela questão, mas mesmo não ignorando a categoria psiquiátrica da depressão optou pelo termo melancolia, ficando assim indicada a sua filiação a uma abordagem do tema mais próxima da literatura, aqui compreendida como um dos nomes da ficção”, explica sobre a escolha da literatura para enlaçar a pesquisa. “Na melancolia, o cenário é desértico, a força da crueldade faz aparição, Freud nunca negara esses aspectos. Todavia, penso que sua opção indica que as teorias psicopatológicas não são suficientes para uma abordagem dos paradoxos que colocam em jogo a morte e, simultaneamente, a criação”.

Karla explica que, em tempos de prozac (fluoxetina), assimilada à questão da depressão, a melancolia tem sido abordada por uma via onde se pressupõe uma negatividade na dor humana e na sua dimensão trágica. “A melancolia é solo fértil para a criação, desde que não neguemos olhar de frente o que nos causa. Por isto antes de publicar a melancolia, à luz do sertão, procurei dar voz aos profetas da chuva considerando suas profecias como narrativas que colocam em jogo a experiência da precariedade e do desamparo humano sem cederem à fadiga, ao pessimismo e ao desânimo”, cita Karla sobre o estudo de toda uma vida que desenvolveu sobre o sertão cearense.

É dela a organização do livro Profetas da Chuva (Tempo D’imagem, 2006), que perfila as histórias e os ensinamentos dos profetas do tempo no sertão cearense. “Na pesquisa o sertão não é apenas espaço geográfico, mas é, sobretudo, geografia imaginativa, lugar dado à poesia e à metáfora, onde se projetam luzes e sombras das nossas perdas, inferno dantesco e paraíso, já dizia Euclides da Cunha”, elabora a autora, natural de Quixeramobim. (Fonte: O POVO)

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