
Ao instrumentista, o que realmente interessa é estar abraçado ao fole, uma visceral extensão do corpo de quem vive para tocá-la. A sanfona dá tudo, mas também cobra o preço. Os momentos sublimes em que sons perfeitos deslizam pelas mãos custam dores, lesões e marcas. O corpo que tem a sanfona como apêndice nunca passa impunemente pelos anos. Mas o sanfoneiro não reclama, afinal, esse é seu quinhão. É dessa forma que ele faz da música brasileira um referencial de cultura e identidade, em qualquer canto do País.
Um desses lugares é Canindé, no Sertão Central, a 126 quilômetros da Capital, onde cinco irmãos cegos, um homem e quatro mulheres, fazem da música uma maneira de ocupar o vazio do dia a dia. Eles formam a Banda Elegantes do Forró, a base de sanfona, pandeiro, zabumba, triângulo e chocalho. Nilo Gomes Araújo, Luiza Gomes Araújo, Graça Gomes Araújo, Helena Gomes e Rita de Cássia, os irmãos nasceram cegos numa família de pai, mãe e 11 irmãos. A cegueira deles é um mistério que os médicos ainda não conseguiram explicar.
Para seu Nilo, a sanfona é sua paixão. "A sanfona toca a alma de nossa gente. Ela faz a trilha sonora do Nordeste", lembra. Segundo ele, aprendeu a tocar sozinho ouvindo os outros tocarem. "Na minha juventude, a sanfona era a minha diversão depois da lida com os animais no campo".
Perguntado como um deficiente visual fazia para lidar com o gado. Ele respondeu: "Eu esperava. Em cada rês, colocava um chocalho, aí a gente sabia qual vinha na frente e qual vinha atrás, sabia que vaca ia passando", diz.
"Um instrumento como a sanfona é um traço cultural do povo, como o violão para a bossa nova, o pandeiro para o sambista, o piano para os eruditos, quase uma extensão do corpo, com uma vantagem, a sanfona é o instrumento que fica mais perto do coração", diz seu Nilo, primo da cantora Kátia Cilene, que despontou no meio musical cantando na banda Mastruz com Leite.
Antônia Pereira Araújo diz que está casada com Nilo há 37 anos e a sanfona é a sua segunda mulher. "Meu marido tem um grande carinho pela música. Ele é fã sob todos os aspectos de Luiz Gonzaga", relata.
Um grande exemplo de vida da família dos irmãos cegos vem de Graça Gomes Araújo, uma dona de casa. É isso mesmo, dona Graça faz tudo. Até a decoração da casa foi ela quem escolheu. Sensível, trabalhadora e vaidosa, Graça não sai para trabalhar sem antes caprichar no visual. "Sou a cantora da banda, por isso está sempre bem na fita".
Rita de Cássia toca o zabumba. Mas em horas vagas cuida de seu comércio. "Sendo em moeda, eu sei passar o troco certinho, agora sendo em cédulas eu passo, mas se estiver tudo separadinho". O que mais chama atenção nessa família é que eles são dispostos, trabalhadores e têm um humor fantástico. Um detalhe especial é que toda família estuda e aprende. Eles se interessam pela educação e tem uma professora que vem até eles.
O material didático na aula são cartões com o alfabeto em braile e a reglete, uma régua onde o aluno faz a perfuração com pressão. Eles perfuram para formar as letras. (Fonte: Jornal Diário do Nordeste)

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