REDIRECIONAMENTO

quarta-feira, 11 de abril de 2018

A roda da canção: compositores desvendam os mistérios da criação musical no Porto Iracema

“A canção está mais viva do que nunca”. Foi com esse espírito que a cantora e compositora Mona Gadelha deu a tônica da Roda de Conversa “Processos Criativos da Música Brasileira”, realizada na noite da última quarta-feira, 4 de abril, no auditório do Porto Iracema das Artes. Com a mediação do pesquisador e escritor Ruy Godinho, o colóquio também contou com a presença dos compositores cearenses Fausto Nilo, Isaac Cândido e Apá Silvino.

Quem ouve uma música e se emociona com ela muitas vezes se pergunta como aquela obra teria sido criada. Qual a inspiração do autor? Quais seus métodos? Quais as dificuldades em se transformar palavras e melodias nesse produto final a que damos o nome de canção? Instigados por perguntas como essas, os compositores presentes revelaram detalhes de um ato envolto em mística e mistério: a composição musical.

O pesquisador Ruy Godinho, mediador do encontro e autor da coleção de livros “Então, foi assim? – Os bastidores da criação musical brasileira”, cujo quarto volume foi lançado em Fortaleza durante o evento, revelou aos presentes diversos “segredos” por trás de composições de grandes nomes da música brasileira como Milton Nascimento, Moska, João Donato, Moraes Moreira, Guilherme Arantes, entre outros. Godinho começou sua pesquisa em 1997 e já viajou o Brasil inteiro lançando sua coleção de livros e também entrevistando e conhecendo a história de compositores País adentro. Seu interesse pelo tema começou na década de 1990, quando apresentava o quadro “A origem da música”, no extinto programa Estação Brasil, veiculado na Rádio Cultura de Brasília. Traçando um rápido panorama das mais de 400 histórias que já ouviu, Ruy resume que a criação musical pode nascer da “inspiração”, da “transpiração”, da “dor” ou até mesmo de processos que nem o compositor sabe explicar direito e que alguns chamam de “psicografia”, gerando no criador uma sensação de estranhamento em relação à obra, como se não a reconhecesse como sua.

Ilustre representante da primeira geração do Pessoal do Ceará, o compositor Fausto Nilo remontou às origens da canção durante a roda de conversa para conceber a música como “trova”, uma forma de contar histórias, remetendo aos bardos e trovadores. Nesse sentido, entende que a canção deve comunicar e sensibilizar, a despeito de apropriações semânticas e interpretações fechadas e estanques das letras. A missão dele, como compositor seria a de “inovar e surpreender”, mas sem se prender ao significado literal das obras. “O que quer dizer essa letra que você fez? Não sei”, brincou o compositor, desmistificando seu processo criativo.

A compositora Mona Gadelha, coordenadora do Laboratório de Música do Porto Iracema das Artes, destaca que existem vários percursos criativos para se chegar até uma canção propriamente dita. Segundo ela, seu processo particular de criação é intuitivo, criando em conjunto música e letra, sem dissociar essas duas etapas em momentos distintos. Contudo, salienta que o ato compor para ela é a materialização de sua própria necessidade de se expressar.

Já o músico e produtor Isaac Cândido compreende o ato de compor como um exercício diário e que a palavra, independente do suporte, “até mesmo uma bula de remédio”, é passível de ser musicada. Nesse sentido, ele contou que, na busca de se encontrar como compositor, percebeu que era mais bem sucedido quando criava melodias para letras e poemas já prontos. Ele revela que, apesar de não ter conhecimento erudito de harmonia musical, procura intuitivamente acordes que acompanhem as melodias que ele invoca criativamente. Nesse mesmo sentido, Fausto Nilo corrobora que a música popular prescinde de um aprendizado acadêmico para formar compositores, como ocorre na música erudita. Para Fausto, mais importante do que a formação acadêmica, as “ambiências, convívios e experiências compartilhadas” propiciam uma atmosfera mais fértil para a criação. “Eu mesmo não sou instrumentista. Sou apenas um proprietário de um violão desde os 15 anos de idade”, brincou Fausto.

Por sua vez, a cantora Apá Silvino encara a composição de uma maneira mais sensitiva, espiritual. Ao longo da noite, cantou ao piano diversas peças do cancioneiro popular, ilustrando musicalmente as histórias contadas por Ruy Godinho, mas emocionou o público ao interpretar uma de própria autoria, cuja inspiração surgiu para ela no trânsito, dirigindo, ao olhar o movimento das árvores pelo vento. Um dos versos mais fortes da canção ,”Qual é a música no coração de Deus?”, simboliza a postura da cantora em face à criação. “Está tudo no ar. É uma intranquilidade, um sentimento, que faz com que me conecte com a música”, desabafou Apá. (Do Repórter Ceará – Roteiro Fortal (Foto: Roteiro Fortal))

Nenhum comentário :

Postar um comentário

O blog Quixeramobim Agora é uma ferramenta de informação que tem como características primordiais a imparcialidade e o respeito a liberdade de expressão.

Contudo, em virtude da grande quantidade de comentários anônimos postados por pessoas que se utilizam do anonimato muitas vezes para ferir a honra e a dignidade de outras, a opção "Anônimo" foi desativada.

Agradecemos a compreensão de todos, disponibilizando desde já um endereço de email para quem tiver interesse em enviar sugestões de matérias, críticas ou elogios: jornalismo@sistemamaior.com.br.

Cordialmente,
Departamento de jornalismo